segunda-feira, 12 de maio de 2008

RELATÓRIO DE POTENCIAL TURÍSTICO DA RIBEIRA

RIBEIRA

Um breve estudo sobre as ruas Frei Miguelinho, Nísia Floresta, Ferreira Chaves e 15 de Novembro, do contexto histórico que as envolve e de suas potencialidades para o turismo.

Trabalho apresentado ao prof. Dr. Walner Barros Spencer como parte do processo avaliativo da disciplina Formação História do RN 2007, segundo semestre.


INTRODUÇÃO

Toda ciência é, em si, e para si, um grande desafio. Principalmente quando esta ciência é nova e, muito embora seja possua particularidades e singularidades que a faz se destacar das demais, ainda assim é, em seu início, carente de muitas das qualidades e atributos que uma ciência já alicerçada já possui, à custa de muito trabalho, investimento e tempo. O Turismo, enquanto ciência social aplicada, muito se aproxima de ciências como a História, por exemplo. Mas verdade seja dita: os objetos de seus interesses e estudos recaem tanto sobre o patrimônio histórico – principalmente em localidades e regiões dotadas de grande acervo material histórico – quanto sobre os patrimônios culturais e naturais e, se observa com freqüência, estes três tipos de patrimônios nem sempre se encontram em uma única localidade. O Rio Grande do Norte é uma das poucas regiões em que estes três patrimônios podem ser encontrados com grande facilidade e rica variedade quer estejam inseridos num conjunto amplo, que os engloba como um todo, quer estejam individualizados em micro universos, distintos entre si por suas características e peculiaridades.

O Rio Grande do Norte é, por sua origem, uma das mais antigas e importantes localidades brasileiras. Sua importância inicia-se mesmo antes do princípio do processo de colonização. Antes dos portugueses e dos espanhóis dividirem o mundo entre si, o litoral do que se tornaria futuramente o Brasil já era bem conhecido pelos franceses, os quais já estavam desenvolvendo plenamente atividades comerciais com os nativos. O Brasil inicia-se no nordeste de seu território e, para tanto, este Estado tem sua importância contribuição. Desde o início da colonização até os dias de hoje, o Rio Grande do Norte sempre foi uma região cuja participação na construção da identidade nacional brasileira e da cultura do povo brasileiro, de modo geral, sempre fora presente e constante.

Para a ciência que é o Turismo, o Rio Grande do Norte é muito mais do que uma faixa litorânea de clima equatorial povoada por típicos nordestinos, tão conhecidos e famigerados pela literatura clássica nacional. O Rio Grande do Norte é, para estes cientistas do turismo, uma região de grande potencial inexplorado e, em sua maior parte, desconhecido. É, pois, destino deste singelo trabalho acadêmico, revelar uma pequena parcela deste potencial, resgatando um pouco da memória e da história do que foi, num passado não muito distante, o brilhante verniz deste Estado tão maravilhosamente rico, mas terrivelmente abandonado e esquecido.


DA RIBEIRA

Dizer que a ribeira é um dos mais antigos bairros de Natal é, em parte, um grande erro. Quando se faz um estudo sério e aprofundado sobre as origens da cidade do Natal, compreende-se, de imediato, que Natal e Ribeira eram totalmente diferentes e, em alguns casos, eram mesmo antagônicas entre si. É, pois, necessário apontar as diferenças históricas e mesmo geográficas entre estas duas localidades.

Natal, a cidade, fora fundada em primeiro lugar. Ela era, em seu princípio, o que hoje em dia é conhecido como Cidade Alta. Seu ponto de partida fora, provavelmente, a porção mais antiga do Paço da Pátria e, de acordo com os textos dos colonizadores, tal porção de terra fora uma doação dos indígenas conhecidos como potiguares que, liderados pelo grande chefe Potiguaçu, após estabelecerem acordos de paz e auxílio mútuo com entre as duas nações – potiguares e portugueses – cederam uma área que servia de acampamento e que, além de ser uma região elevada, também possuía uma nascente de água doce.

O alto elevado e firme procurado por Jerônimo d’Albuquerque em dezembro de 1599 era o platô que se estende desde a praça André d’Albuquerque, envolvendo Petrópolis e Tirol, até a praça Pedro Velho, avenidas até Hermes da Fonseca. O cimo onde se construiu a primeira casa, termina, descendo, no Baldo, prosseguindo, em terreno ondulado para Barro Vermelho, Lagoa Seca, Refoles, orla do Potengi, zona de mangues e de caranguejos velozes.[1]

É preciso compreender que a origem da cidade do Natal está extremamente vinculada a este episódio da colonização e, portanto, vinculado ao próprio início da História do Brasil. Quando os portugueses descobriram, por meio de Martim Afonso, que os franceses estavam se apropriando das riquezas das terras que, pelo Tratado de Tordesilhas, lhes eram próprias, houve a necessidade de desenvolver uma linha de segurança contra estes e quaisquer outros saqueadores.

Depois de navegar por cerca de 300 quilômetros ao longo da costa, a frota cruzou pela ampla foz do rio Potengi (o “Rio Grande do Norte” de então), que fica a cerca de 2 quilômetros ao norte da atual cidade de Natal e onde, cerca de sessenta anos depois, seria construído o Forte dos Reis Magos. [...].[2]

Uma pequena intervenção faz-se necessária na citação acima: o Forte dos Reis Magos não esperou sessenta anos para ser construído. Foi a Fortaleza dos Reis Magos precisou esperar tanto tempo. O fato é que antes da fortaleza, houve uma pequena fortificação – um forte – que servia de base aos portugueses que guardavam aquela faixa litorânea contra o assalto de outras nações, entretanto, se de um lado eles defendiam a costa brasileira contra nações não-portuguesas, eles igualmente tinham que se defender dos nativos, os índios potiguares que, além de serem hostis aos portugueses, também eram canibais e muito numerosos (somavam cerca de 90 mil indivíduos). Todo este processo de ocupação deu-se entre 1531 e 1599, ou seja, entre o início da expedição de Martins Afonso e o final bem-sucedido acordo entre os potiguares e Jerônimo d’Albuquerque.

Natal, pois, era uma cidade que se desenvolveu praticamente sem grande importância durante a colonização. Somente quando o Brasil entrou na rota da expansão comercial marítima é que Natal passou a ter alguma importância e, ainda assim, não por si mesma, mas pelo que surge devido às necessidades dos navegantes e comerciantes: a Ribeira. Deve-se compreender, novamente, que a localização privilegiada desta cidade foi de grande importância: Natal situa-se uma esquina de continente, ou seja, na região brasileira de maior proximidade com o continente africano; era uma região fortificada, portanto segura; e estava próxima das principais capitanias e regiões de produção. Estudos acerca dos pormenores ainda são carentes nesta área, contudo, não é difícil imaginar o que se deu a seguir: sendo a cidade de Natal situada num altiplano, e sendo o fluxo de mercadorias grandes, o transporte para o alto dificultoso, e a profundidade do “rio” Potengi não favorecer a fácil e hábil manobra de grandes embarcações, uma outra localidade, possuidora de melhores atributos, mas presente naquela mesma localidade, precisava ser encontra. E assim “nasce” a Ribeira, todavia, deve-se compreender também que tal localidade não passa a “existir” de um momento para outro e que, é bem provável, alguma parca ocupação humana, mesmo que precária, já se fazia presente naqueles arredores, ou pelo menos é o que indicam os textos dos documentos oficiais seiscentistas[3].

Após este momento, a importância da Ribeira cresce exponencialmente, chegando mesmo a rivalizar com a “Cidade Alta”, que era Natal propriamente dita. Até então, nos documentos oficiais da província, Natal e Ribeira eram localidades distintas e a segunda não era tida como bairro da primeira. Talvez o processo de incorporação da Ribeira pela cidade de Natal tenha sido lento e progressivo, ou talvez, ao contrário desta possibilidade, tal processo tenha sido súbito e inesperado, sendo, ao que tudo indica, fruto da derrocada da Ribeira.

2.1 – A Importância Histórica

A Ribeira foi, em seu princípio, uma região imprópria para habitação. Sua topografia era de alagadiços de água salgada, resultantes das marés do Potengi. Cercada por mangues, ao nível do mar e ladeada mor morros e dunas, sempre que era chegada as estações das chuvas, a ribeira se inundava. Durante muito tempo este problema perdurou. A atenção dos políticos e administradores públicos não repousava sobre a Ribeira e a situação só se agravava, principalmente com o processo de urbanização da Cidade Alta. Após a pavimentação das ruas de Natal, esta tinha seus dejetos levados pelas águas pluviais para terras mais baixas, ou seja, para a Ribeira. Mas este foi apenas o princípio...

As construções de casas seriam pelas atuais rua doutor Barata, Chile e General Glicério. A Ribeira era zona de sítios para plantações, morando apenas os guardas dos armazéns que vigiavam as mercadorias exportadas para Pernambuco. A Cidade Alta era o bairro residencial e comercial por excelência.

A campina diante do Bom Jesus, compreendendo as ruas Duque de Caxias (antiga Sachet, Doutor Barata, Chile, Frei Miguelinho, Tavares de Lira e as paralelas a esta, ainda continuavam desertas nas últimas décadas do século XVIII.[4]

Somente após a entrada do século XIX – 1801 a 1899 – e principalmente com a chegada do século XX – 1901 a 1999 – é que a Ribeira passa a desempenhar grande importância para o Rio Grande do Norte e, principalmente, para Natal como um todo. No séc. XIX o Brasil se torna uma república. Neste século as atividades comerciais marítimas estavam em plena atividade e as colônias americanas dos países europeus buscavam sua independência. A independência brasileira propicia-lhe a liberdade de negociar com quem quer que fosse e, no caso da cidade de Natal, isto foi extremamente importante, pois, sendo esquina de continente, era praticamente uma parada obrigatória para toda e qualquer embarcação que transitava entre a Europa, a África e as Américas.

Toda grande viagem exige manutenção. Em tempos tão difíceis, era necessário um lugar para que as embarcações – único modo de locomoção intercontinental existente no mundo até então – pudessem abastecer e realizar as manutenções humanas e materiais. Natal era esta localidade e a Ribeira era o ponto exato para tanto.

No momento de transição entre os séculos XIX e XX, encontramos uma Natal sofrendo um intenso processo de industrialização. A influência de diferentes povos faz-se muito presente e evidente. Ingleses, franceses, holandeses, espanhóis, italianos, etc, podiam ser encontrados com grande facilidade na Ribeira que, neste período, era uma localidade de extremo luxo e requinte. Tal era sua importância que nela se encontravam todos os tipos de instituições públicas e privadas, como é o caso de bancos e armazéns. Em pouco tempo a Ribeira torna-se popular, povoada e populosa.

2.2 – O Passado Glorioso

Se durante este processo de globalização que se encontra na transição do século XIX para o XX a Ribeira era importante, com o caminhar da Segunda Guerra Mundial, torna-se ainda mais.

O Brasil, enquanto aliado dos norte-americanos e, portanto, inimigo declarado do Eixo, aceitou a instalação de uma base militar americana na cidade de Natal, tendo como objetivo a proteção da faixa litorânea norte rio-grandense, pois, como é de conhecimento geral, trata-se de uma esquina de continente e, é claro, um ponto crucial para toda e qualquer manobras militares defensivas e/ou ofensivas e de alcance continental e/ou intercontinental.

A Ribeira era, neste momento, tal qual uma cidade grande e, do mesmo modo, possuía o melhor e o pior de uma cidade grande. As ruas possuíam edificações residenciais e comerciais indiscriminadamente. Na mesma ruma onde se encontrava um armazém também poderia ser encontrado um grande banco, uma casa residencial, um bar, um prostíbulo e um sindicato, como é o caso da Rua Frei Miguelinho.

O coração da Ribeira estava onde estavam o porto e a estação de trem. O primeiro, local de parada das embarcações, trazia a mercadoria e os viajantes. O segundo, local de embarque e desembarque das marias-fumaça, os transportava Brasil adentro. Para entrar ou sair, do Rio Grande do Norte para o mundo, e vice-versa, só havia um destino certo: a Ribeira. Durante a Segunda Guerra Mundial, as pesquisas militares desenvolvem os aviões a jato, uma evolução dos aviões monomotores que, junto aos bimotores e anfíbios, já conhecidos desde a primeira guerra mundial. Os aviões anfíbios encontraram grande atividade na Ribeira. E assim nasce a fama do Trampolim da Vitória...

A segunda guerra mundial trás à Natal, e ao Rio Grande do Norte, o desenvolvimento tecnológico do primeiro mundo, bem como sua influência direta.

Após esta guerra mundial, vão-se os americanos, mas ainda permanecem as marcas de sua estada. Paralelo a isto á a participação e Natal na conturbada política nacional, como é o caso, por exemplo, da Intentona Comunista. Mesmo sendo esta uma ação política mais global, sabe-se, por meio da história oral dos contemporâneos deste evento, que era na Ribeira, cantinho reconhecidamente boêmio de Natal, que este tipo de pensadores, geralmente revolucionários, se encontravam e discutiam suas idéias.

A Ribeira, após a transferência da sede da administração provincial para o sobradão da Rua do Comércio, em 10 de Junho de 1869, por Pedro de Barros Cavalcanti de Albuquerque, esteve em altas contas. Mas nada dura para sempre...

2.3 – A Derrocada

Era o bairro da maioria dos homens ricos de Natal, do comércio mais variado, das grandes lojas, casas comerciais e emprêsas. Comércio de artigos de luxo, bancos, emprêsas de navegação, etc. Desde tempo imemoriais, conforme afirma o Mestre Câmara Cascudo, a Ribeira era o bairro dos comerciantes. [...].

Era o bairro mais movimentado de Natal. A Avenida Tavares de Lira, com o Cais que também recebeu êste nome no governo de Alberto Maranhão, conforme o obelisco plantado no princípio da mesma, era a mais bonita, limpa, arborizada e bem calçada. Era o local único do carnaval para o corso de carros e as tradicionais batalhas de confete, que durou mais de trinta anos. Quando, então, a cidade cresceu e o povo multiplicou, o carnaval foi transferido para a Avenida Rio Branco e depois para a Deodoro, onde está firme até agora. Foi o primeiro golpe para o declínio da Ribeira.[5]

A vida da Ribeira era sua atividade comercial exclusiva, ou seja, seu poder sobre Natal e demais localidades do Rio Grande do Norte estava delicadamente e intimamente ligada à dependência destas em relação ao seu porto e à sua estação de trem.

Com o surgimento da tecnologia de aviação e desenvolvimento dos transportes rodoviários coletivos e/ou individuais, e com a abertura política e econômica do Brasil ao mercado externo, fazendo pesados investimentos em infra-estruturas urbanas e também em rodovias, a supremacia da Ribeira fora minguando até não mais existir.

A migração dos recursos náuticos para os aéreos e a substituição das ferrovias pelas rodovias: talvez estes tenham sido os golpes fatais que o desenvolvimento e o progresso tenham dado à Ribeira, contudo, não foram os únicos. Talvez o derradeiro golpe fatal tenha sido a mudança, entre outras, da própria mentalidade, em especial a econômica, a política e a comercial, as quais se modificaram drasticamente após os eventos que marcaram o início do século XX. A Ribeira tornou-se, então, pequena demais e obsoleta demais para continuar a ser um dos centros das atenções do mundo e, também, de Natal.

Pior do que morrer, talvez tenha sido apodrecer à olhos vistos.

A Ribeira, em seus dias gloriosos, era representada pela beleza e grandiosidade de suas edificações e pelo luxo dos que por suas ruas transitavam. Foram-se as pessoas, pois estas estariam onde fossem encontrados os grandes centros comerciais. Ficou, pois, as edificações, como representantes materiais do passado e da memória. Mas mesmo esta está sendo destruída, apagada, pouco a pouco, quer pela ação do tempo ou, principalmente, quer pela ação dos homens que, não se reconhecendo naqueles contornos, não o respeitam nem o preservam.


[1] CASCUDO, p. 143.

[2] BUENO, p. 159.

[3] Pertencentes ao Séc. XVII d.C.

[4] CASCUDO, p. 151.

[5] PINTO, p. 25 e 26.


DOS LOGRADOUROS

Para a realização deste trabalho em especial, foram selecionadas, em sorteio, num dia de aula, quatro ruas, que são:

1. Rua Frei Miguelinho – situada entre a Rua Chile e a Av. Almino Afonso, ela se inicia na Rua Silva Jardim e termina na Av. Tavares de Lira.

2. Rua Nísia Floresta – inicia-se na no final da Rua Frei Miguelinho, próximo à Av. Tavares de Lira, e cruza a com a Av. Almino Afonso.

3. Rua Ferreira Chaves – inicia-se na metade da Rua Frei Miguelinho, encontra-se entre a Rua Nísia Floresta e a Rua 15 de Outubro e cruza com a Av. Almino Afonso.

4. Rua 15 de Novembro – inicia-se no começo da Rua Frei Miguelinho, próximo à Rua Silva Jardim, e termina na Av. Almino Afonso.

3.1 – A História Local

Não é possível descrever a importância histórica ou mesmo o potencial turístico, sem, no entanto, enquadrá-las dentro de um contexto maior, que é o das principais ruas que formam a nata do complexo da Ribeira.

A vida da Ribeira estava situada, principalmente, entre dois grandes logradouros: a Av. Tavares de Lira, a qual se iniciava imediatamente às portas do Cais; e a Rua Silva Jardim, a qual se iniciava junto ao Largo da Rua Chile, local onde se situava a estação de trem da Ribeira. Tudo o mais girava em torno destes dois importantíssimos pontos.

Dentre as quatro ruas enumeradas acima, a que possui maior destaque e importância é, ao que parece, a Frei Miguelinho. Ela está cercada pelas principais vias comerciais da Ribeira e, sendo ela própria uma das, entre suas edificações estão destaques arquitetônicos e culturais de grande conhecimento popular, como é o caso da Casa da Ribeira[1] e do Sindicato dos Estivadores[2]. Fazendo esquina com a Rua Frei Miguelinho, e gozando de um pouco menos de prestígio do que estas outras edificações, edifícios como os do Banco do Povo[3] – início da Rua Nísia Floresta – e o Banco do Nordeste – início da Rua Ferreira Chaves (anexo 007) – ainda resistem, apesar do aparente abandono ou das malfadadas tentativas de restauramento.

Uma característica importante das edificações de esquinas erguidas em tempos remotos, é que elas possuem sua entrada principal voltada para o vértice das ruas, ou seja, a entrada não está definida por uma ou por outra rua, como é de costume nos dias de hoje. Edifícios como o da Tribuna do Norte[4], o da antiga Caixa Econômica Federal[5] ou mesmo os bancos já mencionados, são bons exemplos diste fenômeno urbano.

As quatro ruas estudadas neste trabalho acadêmico não são muito diferentes das demais ruas que compõem a Ribeira, com exceção das que dão para o Cais e para a estação de trem, pois, ao contrário destas, tais ruas são estreitas e mesmo curtas. Nos presentes dias não há espaço sequer para a passagem de dois veículos populares simultaneamente, contudo, para as necessidades e possibilidades do tempo em que foram construídas, este tamanho deveria ser ideal.

Alguns transeuntes, cujas costas já estão curvadas e os cabelos embranquecidos pela ação do tempo, e muitas vezes chacoteados pelos mais novos pela senilidade que apresentam, se recordam de um tempo que parece estar muito longe dos dias de hoje. Dizem uns que naquelas ruas havia muitos cabarés, e que a anarquia vivia solta noite à fora. A Rua Frei Miguelinho, também tica como a Rua das Virgens, ainda exibe o que talvez seja o seu ponto mais famigerado: o Beco da Quarentena. Outros senhores já se lembram dos dias em que o Banco do Brasil efetuava o pagamento dos militares. Dizem estes senhores que quando coincidia do pagamento do exército sair junto com o da marinha, cada um dos soldados destas forças armadas tentava tomar, para si e seus pares, o domínio das moças das casas noturnas, o que sempre acabava rendendo violenta confusão. “Já morreu foi muita gente aqui, os soldados...”, disse-me um senhor que atravessava, às pressas, o Beco da Quarentena, no mesmo momento em que eu a fotografava.

Como principal defeito e, desde também tempos mais remotos, como até hoje, teve a Ribeira a pouca sorte de ser a Capital Federal da prostituição profissional. Ali o meretrício era franco e escandaloso e até funcionando perto das casas de famílias. Na Ribeira sempre existiram as pensões alegres mais ricas e bem servidas, como outras mais modestas. Da boate mais granfina até o sórdido, imoral e já tristemente célebre Beco da Quarentena. Para a Ribeira desciam os freqüentadores do amor pago e lá encontravam os embarcadiços nacionais e estrangeiros. E neste setor a Ribeira deu, como ainda hoje, muito trabalho à Polícia, porque a prostituição é irmã gêmea do álcool e prima da baderna. Com a saída das famílias para outros bairros, o meretrício aumentou. Embora pensões alegres estejam espalhadas por outros bairros, a Ribeira não perdeu a posição de destaque no comércio de carne humana viva.[6]

Sobre a prostituição, muitas histórias, mitos e lendas povoam a mente e a memória dos moradores de natal. As famosas “Casas da Luz Vermelha”, fenômeno urbano que provavelmente tem origem durante a segunda guerra mundial, quando, com medo dos ataques nazistas, as casas litorâneas eram proibidas de acender luzes e que somente a luz vermelha, imperceptível a longas distâncias por possuir baixa vibração, era permitido. E como a única instituição a funcionar quase que somente à noite eram os cabarés...

Sedo a história das casas “de luz vermelha” uma verdade ou não, o fato é que num tempo onde a iluminação de espaços públicos ainda não era uma realidade comum, tal como é agora, no século XXI, foi na Rua Frei Miguelinho que se deu, também, a inauguração de uma iluminação pública.

A Ribeira teve luz acetíleo em primeiro lugar. O primeiro trecho a iluminar-se, na noite de 29 de junho de 1905, foi entre a Frei Miguelinho, compreendendo o quartel do Batalhão de Segurança que ficava na esquina da Silva Jardim, até a praça Augusto Severo.[7]

Mas se a questão é a veraticidade do pode ser dito e ouvido entre os mais velhos moradores e transeuntes da Ribeira, então a verdade pode ser encontrada e comprovada nos documentos escritos e, também, na própria estrutura das casas e demais edificações que se encontram nestes logradouros.

3.2 – As Edificações

No que tange as proporções, os tamanhos e os volumes, têm-se a impressão de que a Ribeira não era lá estas coisas, como se vê e compreende pelos livros de História, contudo, para que o entendimento do que foi a Ribeira se faça fiel e justo, é preciso compreender, também, as pessoas daquele tempo. As noções de tempo e espaço não eram similares às que se tem hoje em dia. No que concerne o tempo, as pessoas viviam vidas menos agitadas e menos intensas. Nada era tão corrido e urgente como é agora, no pleno início do século XXI. Há mesmo registros de acidentes por atropelamento envolvendo os bondes que cruzavam a cidade de Natal no início do séc. XX, os quais, em velocidade, não se comparavam às locomotivas que ligavam os Estados pelas estradas de ferro e que, hoje em dia, não se comparam nem mesmo ao mais lento automóvel popular. No que concerne o espaço, a mesma coisa pode ser dita: a noção de espaço das pessoas daqueles dias era diferente da noção de espaço das pessoas dos dias presentes. Se forem observados os padrões das casas residenciais do estilo arquitetônico colonial, será observado que são, quase todas, possuidoras das mesmas proporções geométricas. Outro fato que pode ter exercido grande influência neste quesito é a própria natureza da metragem da doação de terras feitas pelo poder público. O fato é que parece haver uma proporção simétrica entre casas residências, que por sua vez são diferentes das edificações comerciais de pequeno porte e, também diferente desta última, a de grande porte, que por sua vez são diferentes das edificações públicas.

Um dos locais que surpreendentemente ainda preserva algo da sua originalidade sem, no entanto, sofrer qualquer tipo de ação de tombamento, preservação ou similar, é o Beco da Quarentena. Indícios arqueológicos apontam, por exemplo, para a natureza diferenciada das construções que lhe ladeavam. Tal beco, muito estreito, apresenta paredes que, se hoje estão hermeticamente fechadas por tijolos, a diferença dos tijolos antigos em contraste com os tijolos modernosos alerta para o fato de que, na parede original, haviam grandes arcadas, ao modo de portas, por onde os clientes – e suas damas – podiam transitar sem empecilhos. Uma ou outra destas “pensões alegres” possuía seus frontões virados para o beco, e isto pode ser facilmente observado ao atravessar esta diminuta via que ligava a Rua Chile à Rua Frei Miguelinho. Parece que, em dias um pouco anteriores a estes destas narrativas, havia outro beco, ou pelo menos uma entrada para uma espécie de largo. Dizemos como uma afirmação velada, pois, observando o modo como os traços antigos da arquitetura das construções em questão se manifestam, notamos que há uma estreita passagem que poderia ser, provavelmente, a entrada de tal beco ou largo e que este, atualmente, encontra-se bloqueado por uma construção pertencente, no mínimo, às ultimas décadas do século passado. Para observar tal construção, basta ir à casa que tem por “CASA MINERVA” nome escrito, em alto relevo, em sua fachada, quase de frente ao início da Rua Nísia Floresta. De qualquer modo, é de conhecimento dos antigos moradores e transeuntes destas ruas que por ali fervia a promiscuidade, e a própria Rua 15 de Novembro era conhecida como um cortiço. Os armazéns são, pois, as segundas maiores edificações encontradas nestas ruas, e só perdem, em tamanho e em pontas arquitetônicas, para os bancos. Na Rua Frei Miguelinho, duas edificações se destacam por estarem “impecavelmente” preservadas: a Casa da Ribeira, que era uma das primeiras filiais do Armazém Pará; e o prédio que é o Sindicato dos Estivadores. Os bancos – do povo e do nordeste – são as outras edificações que estão em melhor estado de preservação.

Sobre o estilo arquitetônico não há muito que dizer. Nestas quatro ruas há o predomínio do estilo colonial, facilmente observado nos frontões das casas e armazéns. Com uma provável exceção dos bancos, que podem ser, mas não com grande probabilidade, pertencentes ao estilo eclético.


DO POTENCIAL TURÍSTICO

O Potencial Turístico da Ribeira é imenso. Poderia ser muito maior, é claro, se houver um pouco mais de boa vontade da administração pública e, de igual forma, das iniciativas privadas, pois são estes, em grande parte, os maiores beneficiados. Não só o Estado do Rio Grande do Norte ganharia com o resgate e o restauramento da antiga Ribeira, como o Brasil e o mundo como um todo, no que tange à História por si mesma, e a população de Natal e entorno, direta ou indiretamente, pelas possibilidades comerciais que certamente surgiriam se fossem dados maiores cuidados ao patrimônio material que são as edificações que ali existem e resistem.

A primeira grande importância da Ribeira, para o turismo local, regional e nacional, é a riqueza arquitetônica que ali existe. Nela, como um todo, há uma vasta variedade de prédios que assinalam bem os quatro estilos arquitetônicos de maior presença nesta região: o colonial, o neoclássico, o art nouveau e o ecletismo.

A segunda grande importância da Ribeira, para a História local, regional, nacional e mundial, é a imensa possibilidade arqueológica – sem mencionar a paleontológica – que ela ainda preserva em seu solo, ou sob ele, fator este que, por si só, também aumenta o valor e a possibilidade turística direta ou indiretamente. Sabe-se que toda esta região que é a grande Natal fora palco da habitação e trânsito de várias etnias indígenas desde muitos milênios antes da chegada do primeiro europeu ao solo das Américas. Sabe-se também que são nos vestígios do passado que a história se constrói. A Ribeira, como fora constatado no Beco da Quarentena, ainda guarda os restos daqueles tempos, e de tempos ainda mais antigos, como foi o caso do fundo de garrafa de vidro soprado (anexo 007) encontrado ao acaso, em meio ao piso antigo e entre tijolos igualmente pertencentes ao passado. Uma investigação arqueológica bem dirigida e direcionada iria descobrir maravilhas nas ruas da Ribeira, principalmente no que tange a restauração das fachadas originais dos outrora fabulosos frontões que, um após outro, formam a mais rica preciosidade arquitetônica de Natal.

Muitas e diferentes importâncias, tanto turísticas quanto históricas e historiográficas, a Ribeira poderia apresentar, e a única limitação existente é a da imaginação, criatividade e boa vontade de quem conduz a máquina administrativa pública desta cidade, deste estado e desta região, bem como país.

4.1 – A Memória e a Cultura

Natal talvez seja a única cidade brasileira que, havendo tido tão grande participação nos eventos formadores da identidade nacional e da história de seu próprio país, bem como de outros, despreza a riqueza ocultada pela ilusória sombra do passado e investe, enganosamente, em meios que não podem ser nem tão produtivos nem tão glamourosos quanto seria o investimento, de modo coerente, ordenado e planejado, na preservação da memória e do patrimônio. Ouro Preto, cidade histórica de Minas Gerais, atrai turistas do mundo todo para suas ruas antiguíssimas. Este é um bom exemplo de como a preservação do patrimônio e o pleno desenvolvimento turístico podem, sim, andar de mãos dadas.

A Ribeira foi mais do que um “bairro”: ela foi, por muito tempo, o coração de Natal e do próprio Rio Grande do Norte. Durante quase cem anos, ao se pensar em Brasil, os navegadores do mundo todo pensavam na Ribeira. Os escritores que viveram aqueles dias, escrevem em seus livros, repletos de saudade e de uma profunda nostalgia, as belezas que existiam por aquelas ruas, naqueles dias. Movimentos políticos revolucionários. Paixões arrebatadoras e namoricos nas praças tão belamente ornamentadas. Amizades e aventuras noturnas, embaladas aos braços e abraços das damas dos prazeres. Os tempos de escolas que já não mais se encontram por aquelas bandas. Um lugar onde o luxo e o lixo dividiam o mesmo espaço, cotidianamente.

Quando se anda por aquelas ruas, é impossível, por algum momento que seja, ao entregar-se à imaginação reconstrutora, ver-se transitando no que foi, para muitas gerações, o melhor lugar para se estar em toda a Natal. Soldados e marinheiros, comerciantes e banqueiros, famílias e meretrizes, gentleman e estivadores... A Ribeira era um lugar de todos, a todos pertencia e não parecia não fazer distinções ou preferências entre seus ocupantes.

Hoje em dia não há mais aquele apaixonado que, juntando grande soma de dinheiro, resgata sua amada de uma “pensão de prazeres”, para casar-se com ela e, dela, ter filhos e filhas. Para onde foi tanto amor nem tanta poesia? Hoje já não há mais as conversas revolucionárias que tão facilmente eram encontradas nos recintos de boemia. Onde estão àquelas conversas que sempre buscavam mudar e melhorar o mundo? Hoje já não há mais o cavalheirismo dos senhores que, trajados com elegância, conduziam carinhosamente suas amadas pelas vias das praças da Ribeira e pelos passeios públicos que ali existiam. Onde estão estes casais, que sob a luz da lua, ou afugentando-se da fúria do sol, caminhavam lentamente, absorvendo e sorvendo cada precioso minuto que se podia passar, de braços dados, com sua alma gêmea?

Sobre a memória, o que pode ser dito, agora, é que os valores apreciados pelos homens e mulheres daqueles dias estão muito à parte dos valores apreciados pelos homens e mulheres dos presentes dias. A cultura, a mentalidade das pessoas modificou-se drasticamente. O pudor e o recato são diferentes, ou mesmo quase inexistentes, se formos considerar a opinião dos poucos vivos lúcidos que, conhecendo aqueles dias, desconhecem a moda e o modismo de hoje. Os carnavais eram diferentes. As roupas eram diferentes. O comportamento era diferente. A própria noção de tempo e espaço era diferente. E é ali, nas ruas da Ribeira, que o melhor e o pior desta diferença podem ser reencontrados. Por enquanto, permanece apenas o pior...

4.2 – Sobre os edifícios “de grande importância”

Um dos grandes problemas dos tempos presentes é a concepção capitalista – de ganhos e perdas contabilizados em cifrões – que a tudo envolve e engloba, mesmo àquelas que não são de sua ossada. A história é um bom exemplo disso.

Durante muito tempo a história ocupou-se com as grandes figuras reais e militares, pois em tempos em que as figuras mais admiradas – e invejadas também – eram os imperadores e generais, os nobres e a alta hierarquia, nada mais natural do que deles se falar. Com o fim do tempo dos reis e grandes generais, chegou o tempo dos burgueses e, depois, dos capitalistas. A história, migrando de um grande para outro, passou a narrar a vida e a obra de grandes empresários que, por uma estranha “coincidência”, também eram ilustres figuras políticas e públicas. Tal fenômeno se observa com grande facilidade no nordeste brasileiro, região que tem, por excelência, a fama de ser a mais conservadora do país. Nas terras dos grandes coronéis e capitães, nas cercanias dos grandes fazendeiros e escravistas, o que manda é o poder (econômico) e o sobrenome da família.

Observando por este prisma, não se é de estranhar que, na Rua Frei Miguelinho, por exemplo, as únicas edificações que estão bem preservadas ou devidamente “tombadas” – mesmo que inativas – são as que pertenceram a grandes empresas e empresários ou a ilustres figuras da história social e política local. Tal é a situação da Casa da Ribeira, dos bancos e, em menor proporção, da antiga propriedade dos antepassados do finado herói Frei Miguelinho – hoje aos pedaços. Poucas são as edificações que se encontram preservadas, contudo, não se encontra inalteradas, o que é um grande problema para a preservação de tão belo patrimônio e tão preciosa memória (anexos 004 a 007). Outras tantas edificações apresentam tantas alterações estruturais que dificilmente se reconhecem nelas o valor histórico do passado que fora tão glorioso. O destino dado à casas tão nobres, a quase cem anos, chega a ser vergonhoso. O que pensariam seus moradores e descendentes que na casa onde moraram e onde moraram seus antepassados funciona, por exemplo, um galpão que mais parece um depósito de lixo? Em nome da sobrevivência, a dignidade fora esquecida completamente.

Os únicos edifícios que aparentam estarem gozando de bons cuidados são os grandes edifícios públicos do passado, os quais hoje servem, ainda, mesmo que para fins diferentes, ao Estado. O prédio onde é, hoje, o ITEP e o STTU são bons exemplos destes prédios que são encontrados na Rua Ferreira Chaves. Nesta mesma rua deveria existir um grande prédio comercial, tão ilustre no passado, mas dele não existe nem mesmo o nome...

Talvez, nestas quatro ruas estudadas durante o desenvolvimento deste trabalho, a unida edificação que não era pertencente a uma grande empresa ou empresário, nem à grandes famílias, mas que ainda se encontra em pé, firme, forte e preservada, é o prédio onde funciona, a mais de setenta anos, o Sindicado dos Estivadores.


[1] “Construída em 1911, esta casa foi uma das primeiras filiais do Armazém Pará. No ano de 2001, ela foi transformada no Espaço Cultural Casa da Ribeira”.

[2] Fundado em 1º de Janeiro de 1936.

[3] Atualmente sede do BANDERN (B.D.R.N. – Bando do Estado do Rio Grande do Norte).

[4] Esquina de cruzamento entre a Rua Nísia Floresta e a Av. Almino Afonso.

[5] Esquina de cruzamento entre a Rua Ferreira Chaves e a Av. Almino Afonso, atualmente sede da STTU.

[6] PINTO, p. 30.

[7] CASCUDO, p. 154.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Revitalizar não significa reformar ou, utilizando uma palavra que descreveria melhor o que acontece na Ribeira atualmente, deformar. Mesmo que o progresso tenha sido um duro golpe à Ribeira, permitir que acontecesse com ela o que se observa hoje é quase um crime. Deveria ser um crime.

Abandonada pela alta sociedade, a Ribeira fora entregue aos degenerados filhos da noite. Tornou-se, ao que é de conhecimento geral, um antro de perdição, liderados pela prostituição e pela boemia. O antigo esplendor extinguiu-se, ao que parecia, para sempre.

A Ribeira, e arredores, se tornou o submundo de Natal. A antiga estação de trem encontra-se totalmente abandonada e somente o Cais ainda funciona. Recentemente, com uma urgente reforma na estrutura do porto, é que novo fôlego animou a Ribeira, contudo, apenas para gigantescos empresários, e os pequenos nem às sobras destes podem encontrar refúgio. Após o súbito solavanco de progresso que em tão pouco tempo transformou Natal – como é o caso da vinda das grandes empresas de fast food e hipermercados, entre outras –, iniciativas diversas tentaram reviver a Ribeira. O que parecia ser uma boa idéia se tornou um pesadelo: as antigas estruturas estão sendo, literalmente, destruídas. Já não mais se reconhece, na Ribeira, o passado tão bem descrito pelo mestre Cascudo e outros tantos escritores regionais.

A única solução para que a Ribeira volte a ser, pelo menos em memória, o que fora outrora, é preciso que haja uma intensa transformação na percepção e na mentalidade dos que dela possuem o controle e a posse. Não basta apenas tombar, pois uma estrutura antiga intocada, se seu dono não possuir recursos – ou interesses – para lhe preservar, então tal patrimônio, mesmo que tombado, irá definhar e desaparecer, aos poucos, como é o caso da antiga propriedade dos antepassados do Frei Miguelinho, hoje entregue à própria sorte.

Para que Natal, e o Rio Grande do Norte como um todo, possam entrar na rota do turismo, internacional, principalmente do turismo histórico, e fugindo da tão negra fama do turismo sexual, então a melhor solução que se ponde encontrar é reativar, mas sem deformar ou descaracterizar, as ruas da Ribeira.

Esperamos, pois, que os bons tempos retornem, ou que pelo menos não sejam esquecidos, ou conspurcados pelo descaso daqueles, desconhecedores de suas próprias origens, também desconhecem sua própria grandeza e importância.


ANEXOS

Anexo 001: Rua Frei Miguelinho

Alunos do curso de Turismo, durante a aula de campo, próximos à Av. Tavares de Lira.

Anexo 002: Rua 15 de Novembro

Fotografia tirada da esquina da Rua 15 de Novembro com a Rua Frei Miguelinho.

Anexo 003: Frontão da Casa da Ribeira

Uma das pouquíssimas edificações cuja preservação não apresenta sinais de descaracterização do estilo arquitetônico ou da arquitetura original.

Anexo 004: Uma das casas da Rua Nísia Floresta

Observa-se, pelo frontão, que esta casa foi “repartida ao meio” para poder acomodar dois comércios diferentes.

Anexo 005: Uma antiga “boate” da Rua Frei Miguelinho.

Embora “preservada”, apresenta berrantes interferências na arquitetura original, descaracterizando totalmente a “antiguidade” do edifício.

Anexo 006: Frontão oculto por propagandas e alterações contemporâneas.

Embora os símbolos do frontão estejam bem preservados, vê-se que tal preservar não foi intencional, mas antes acidental.

Anexo 007: Vista lateral do antigo Bando do Nordeste

Embora ainda preserve os sinais da arquitetura original, seu “salvamento” não está sendo conduzido da maneira adequada a um patrimônio histórico e cultural.

Anexo 008: Edifício abandonado – Rua Frei Miguelinho

Os sinais do desgaste causado pela ação do tempo e pelo abandono.

Anexo 009: Beco da Quarentena

A parede lateral de um dos cabarés que ajudaram a fazer a fama deste beco.

OBS: O edifício bem preservado, à frente, encontra-se na Rua Chile.

Anexo 010: Calçamento do Beco da Quarentena

Um dos poucos locais da Ribeira que ainda preserva amostras do calçamento antigo.

Anexo 011: Uma parede antiga totalmente descaracterizada – Beco da Quarentena.

O alicerce desta parede aparenta ser original, contudo, os tijolos furados (contemporâneos) são um forte indício de que ela fora alterada com o passar do tempo.

Anexo 012: Vidro Soprado – fundo de garrafa – Beco da Quarentena.


REFERÊNCIA BIBLIOGRAFIA

VENTURE, Paulo. Natal para jovens cidadãos o nosso município. [Sem local: sem editora, sem data.]. Registro na BCZM: 2007013683.

DANTAS, Manoel. Natal daqui a cinqüenta anos. [Sem local: sem editora, sem data.]. Registro na BCZM: 2006015368.

CASCUDO, Luís da Câmara. História da Cidade do Natal. Natal (RN): RN Econômico, 1999.

PINTO, Lauro. Natal que eu vi. Natal: Imprensa Universitária, 1971.

STADEN, Hans. Viagem ao Brasil (coleção A Obra-prima de Cada Autor nº 230). São Paulo: Martin Claret, 2007.

BUENO, Eduardo. Capitães do Brasil: a saga dos primeiros colonizadores (Coleção Terra Brasilis nº 3) – 2.ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2006.



um trabalho produzido e apresentado por:

Gabriele Laíse Trigueiro Góis

Henrique Rodrigues de Oliveira Júnior

Renata Medeiros

Taísa Maria R. da Costa

Yves Lemos

em

Natal, Novembro de 2007

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

O ECLETICISMO EM NATAL

A arquitetura produzida no Rio Grande do Norte e em Natal foi muito modesta em suas dimensões e soluções. Por ser uma província de poucos recursos financeiros, a arquitetura pouco se desenvolveu na sua totalidade e quase nada foi preservado.

Com a vinda da Coroa portuguesa para o Brasil, houve uma grande influencia européia na arquitetura e nos hábitos da população. Quase tudo era importado do velho mundo, inclusive alguns elementos arquitetônicos, como grades ferro rebuscadas inspiradas num novo movimento artístico que surgia na passagem do século XIX para o século XX: o art nouveau.
Assim como todos os estilos, o art nouveau chegou tardiamente ao Brasil e, principalmente, ao Rio Grande do Norte, e não se difundiu na sua totalidade, mesclando-se ao neoclássico, originou o ecleticismo.

Teatro Alberto Maranhão - Fonte: www.natal.rn.gov.br

Um exemplo a ser citado é o Teatro Alberto Maranhão, que articula elementos arquitetônicos de diferentes estilos. A fachada principal, ao nível do térreo, está guarnecida com cinco portões de ferro, fundidos em Paris e igual número de janelas no pavimento superior. A cobertura é arrematada complatibanda, adornada com elementos de metal, jarros e janelas importados da França.

Prédio onde abria a OAB - Fonte: www.natal.rn.gov.br

Não obstante se verifique claramente a sua origem neoclássica, a presença dos elementos trabalhados em ferro fundido remete ao estilo art nouveau e o uso de outros elementos decorativos na fachada permite caracterizar como obra eclética.

Também encontramos o estilo eclético no prédio onde hoje abriga a Ordem dos Advogados do Brasil, construído em no início do século XX, a partir de um projeto do arquiteto Herculano Ramos, fortes referências ao estilo neoclássico, contudo elementos em ferro fundido são influências do art nouveau. Uma de suas principais características são os motivos ornamentais inspirados nas formas orgânicas da natureza.

Cabe ainda mencionar a influência da revolução industrial na arquitetura. Os elementos decorativos passaram a dar lugar à racionalidade. Surgiu assim, o movimento art deco que se desenvolveu a partir de 1925 na Europa. Os artistas e arquitetos vinculados a esse movimento procuraram conciliar a arte e a indústria (desenvolvimento tecnológico). Na arquitetura, valorizavam-se as linhas, planos e volumes geométricos, os quais também se atribuíam funções decorativas.

Cine Rio Grande - Fonte: www.natal.rn.gov.br

Em Natal, o art deco está bem retratado no edifício onde funcionou o antigo cinema Rio Grande construído em 1949. Verifica-se a predominância de planos e linhas retas, formas escalonadas e um jogo de volumes de alto e baixo relevo, o que confere às suas fachadas variedade e ritmo.

Grande Hotel - Fonte: www.natal.rn.gov.br

O edifício do antigo Grande Hotel, projetado pelo arquiteto francês George Mounier (contratado pelo Interventor Mário Câmara), inspirado em linhas simples, primado pelo despojamento decorativo, é arrojado pela sua dimensão, possui quatro pisos e fachada em semicírculo. A entrada principal é marcada por uma escadaria, duas colunas, duas sacadas no terceiro e quarto pavimento. Uma espécie de varanda na cobertura, na forma de pórtico, revela leve inspiração clássica dessa obra, contudo não chega a abalar sua concepção deco.

Aos poucos, a arquitetura da cidade foi se transformando, os ornamentos rebuscados do art nouveau passaram a dar lugar aos elementos oriundos de uma nova era tecnológica de linhas retas. O art deco situou-se em meio a uma transição da arquitetura ainda referenciada nos padrões clássicos para uma nova arquitetura funcional, desprovida de elementos decorativos, onde o belo está nas formas geométricas e puras.